Deus, te agradeço pela morte, a certeza do fim adia a pressa da felicidade. Não olharei para a morte insatisfeita por sua chegada, espero apenas que ela não me surpreenda mais cedo do que imagino. Saber que ela chegará, me faz viver o minuto que tenho intensamente, dizendo mais sim para as aventuras, mais não para o que amarga os dias. Pensar que posso desaparecer me faz não negar mais amor e gentilezas, e ao fazer isso, descubro que são coisas que quanto mais dou, mais tenho parar dar – e principalmente, sobreviverão no outro apesar de mim, apesar da presença. Não penso que a morte é um limite, um ponto final, é apenas um alarme de que é preciso ter urgência em descobrir quem se é, ou se descobrimos cedo demais, reinventarmo-nos, evoluirmos. Serei egoísta com o tempo: até o último segundo, aquela última vez em que eu trazer ar para meus pulmões, não darei à ele a trégua de ser achada inútil e desocupada. Deus, te cansarei em estar viva – me desculpe se meus excessos redobram teus cuidados, mas minha maturidade em enxergar o que vislumbro desde agora faz com eu permaneça sendo a menina dos teus olhos. O que nunca irei considerar é a ideia de morrer antes do tempo. Acinzentar os dias, me trancar em casa, ter medo de arriscar, de me perder. O medo é parente próximo da morte prematura, a morte que existe em vida e não percebemos. Deus, temos um trato: a morte que venha me visitar só quando necessário, e quando vier, que se atrase. E algo mais peço: não deixe que a família e amigos me leiam qualquer coisa, quero ter vivido tanto a ponto de ter consumido todas as palavras das bocas de quem amo. Que a minha vida seja o poema que lerei, muda, para eles em minha despedida.
Cáh Morandi