Difícil despertar para o amanhã, sei do que falo. Há em nós, em certa parte da vida, uma madrugada mais duradoura, mais profunda, mais oculta que o normal. Se parecerá intransponível, acumulará parte dos sonhos de outras noites ainda quentes, trará a insônia e as perguntas infantis de quem ainda não conhece o mundo. Os lençóis sabem o contorno do corpo, os travesseiros colecionam os cabelos e se perfumam. O rosto é cada vez mais salgado de lágrimas. Não há tortura maior do que quando não saímos de nós mesmos por estarmos enclausurados no outro. Ignoramos a despedida para tornar anônima a história sobre o final. Partir é mais fácil que ficar. Quem parte leva o que precisa e no caminho se distrai com a nova paisagem. Mas quem fica, fica com tudo e se torna prisioneiro do ambiente do fracasso. Depois de um tempo – que para uns dura mais e outros menos – uma frestinha de luz tenta atravessar as cortinas e somos surpreendidos ao lembrar que vida continua em movimento. E nesta história tão universal e ao mesmo tempo tão particular, pensei: não ficarei atrás das cortinas, é hora de abrir as janelas.
Cáh Morandi