julho 15, 2013

meu sim



Conheço os nomes e os locais 
de todos os terremotos se ele me olha
inexistem as minhas estruturas –
queria cair no meio do seu abraço –
não sei o que há entre nós
ou é justamente o que não há

tire de mim o meu sim,
não é só você,
eu já quis bem antes.

Cáh Morandi

julho 10, 2013

amor futuro




Não preciso mais ter medo de errar no amor. Vi nos seus olhos que me aceitaria depois de todas as minhas desilusões, me esperaria chegar exausta depois de tantos desacertos. Descanso quando sua mão pressiona meu braço, beijo seus lábios enquanto você me ama com suas milhões de palavras. Me perdoe por não saber corresponder ou não poder corresponder na altura e profundidade que você merece. Agora vou errar, e você sabe, sofre e espera. Sei que é você que irá me recompor no futuro e me ensinará tudo de novo sobre todas as coisas, e quero reaprender. Ainda não estou, mas caminho para você, sei que sabes. Queria ter dito. Queria que você me chacoalhasse pelos ombros e derrubasse as minhas intenções que não são suas. Mas teu amor é paciente, teu amor não me atropela, teu amor me dá a liberdade da escolha. Teu amor me espera, teu amor se guarda para mim sem mais perguntas. Ainda te amarei. 

Cáh Morandi

julho 09, 2013

esquecerá



Com o tempo você irá me esquecer, assim como se esquece as chaves sobre a mesa, como se esquece as tristezas num dia qualquer de domingo, como se esquece de observar as flores se abrindo na sua estação. Você vai, e algum dia olhará para nós de um lugar já muito distante, mas um sentimento de ontem poderá se balançar. Esquecerá com a obrigação da tua nova vida, esquecerá porque é o que restará depois de inúmeras alternativas. Esquecerá de aquecer meus pés no inverno, esquecerá de procurar livros que ninguém tem, esquecerá as canções que escolhemos para eternizar nossas histórias, esquecerá o som da nossa voz no meio da madrugada, esquecerá de viver o imprevisto que nos assaltava, esquecerá nossos desejos mais secretos: nossa boca com gosto de mel, nossos corpos embrulhados na fita, nossa garganta arranhada das profundidades das palavras perdidas. Me esquecerá quando cruzar comigo em alguma rua, a distância envergonhará nossa nudez. Me esquecerá quando outra poesia te surpreender e te ler mais do que a mim. Me esquecerá fixando os olhos em outras costas, em traços de outras tatuagens. Me esquecerá nos domingos, em outra sala, novos sofás, parecidos carinhos. Talvez também te esqueça. Penso (e sei que pensas) em quem, um dia, nos roubará de nós. O amanhã nos atravessará com a sua covardia. Sem perceber estaremos em mapas desiguais. Haverá saudade, haverá vontade e nada poderemos fazer. Colheremos a escolha do agora, inevitável. Será isto, previsto. O caminho é sempre para frente, um trem não tem escolhas, e aqui nos colocamos de passagem. Amadureceremos na dor, não na culpa. Teremos novas mãos entre as nossas. Nossos planos conheceram seus nomes, nossos filhos não reconhecerão nossos rostos. Nosso amor não conheceu a vida, ficará sempre por nascer, prematuramente.

Cáh Morandi

julho 03, 2013

me decora


(...) Doce é ver ele decorando cada pintinha da minha pele, como se fosse uma poesia, como se fosse a mais linda poesia, como se eu fosse sua poesia. Meu corpo agora é seu livro de cabeceira. Conhece minhas páginas marcadas. Me grifa a palavra que alerta. Me dedica para sua vida, com amor.


Cáh Morandi

julho 01, 2013

para a vida


Hoje acordei perdida para meus olhos. Vejo além do que me parece, certo ou errado, esquece, hoje não me convém acertar. Quero o vento e o beijo no rosto e um gosto na boca perto do romã, descansar um cobertor nas minhas costas e um abraço repleto de uma remota vontade de amar. Quero o livro, comer a palavra, me alargar na poesia. E quero a voz, a voz no ouvido, a voz que tem um gemido para me torturar. Quero os pés descansados na areia, ou dentro da meia, ou jogados no ar. Quero a varanda ao invés da casa, quero a paisagem, a folhagem, a aragem, a bobagem de jurar um amor. Quero deixar meus olhos fechados, meus lábios guardados, meu coração chaveado. E quero que você venha, quero que você chegue, quero que você more, quero que demore o tempo de uma vida ao meu lado.

Cáh Morandi

junho 28, 2013

Quase nós


Caminho exaustivamente pelos dias, atravesso a agonia da rotina, sacrifico o limite, estendo os horários. Percorro os dias e conto as semanas, agora o tempo é quase pouco. Avisto um bom porto para descansar da viagem, ancoro. Do céu aberto identifico a árvore, o galho e seu ramo, recolherei as asas. A distância do meu colo deitado em teu ombro diminui. O teu cheiro já alerta tua chegada. A realidade se despede para nos dar o sonho. Amarei fortemente, pois a força é meu descanso. Meu corpo ocupará o seu no mesmo lugar do espaço, sem física que nos explique. Juntos nada nos justifica ou questiona, dispensamos as palavras, importa os lábios. Quase estamos em paz.


Cáh Morandi

junho 27, 2013

reflexo




paraliso em frente ao espelho:
me vejo com teus olhos,
vagarosamente me visto
com tuas mãos imprecisas,
jogo o cabelo para o lado
com o impulso do teu ar,
meu reflexo é sua imagem,
minhas curvas as estradas
que percorremos nos beijos -
únicos e difusos, nada mais
nos separa e diferencia,
meu amor-próprio é você



Cáh Morandi

junho 26, 2013

seja


Não espere de mim o apelo ou o pedido, porque ao contrário da pergunta, sou a resposta. Já estive do outro lado e não quero mais. Quero que venha porque quer vir. Quero que fique porque quer ficar. Se você se despedir, quero a dor da certeza que quis se despedir. Não somos mais os jovens de outra hora. Há quanto tempo já desacreditamos do amor? Sobreviveremos a esta verdade. Suportaremos o fato de sermos de outros, mesmo sendo nossos. Descartaremos as hipóteses e as poesias. Verei algum pôr-do-sol e desconfiarei ser uma indireta tua atravessando o tempo. Meias palavras. Por que você nunca foi completo?

Cáh Morandi

junho 25, 2013

escrevo-me



Se uma notícia ruim me atravessar não me prenderei a ela. Hoje preciso ver além da chuva, hoje preciso sentir além do frio, só assim não me recolherei. Recomponho a dor de me perder para o acaso, isto que toma de surpresa pelo caminho e desmorona as esperanças. Agora adio a felicidade sem pressa de possuí-la, para quer ter nas mãos algo que pesa bem mais do que alivia? Esqueço o nome do filho que não tive, lembro das viagens que fiquei por fazer, me divirto pensando nas noites que não dancei. Meu corpo corrompe com o trato de irmos até o fim, não envelheceremos só para não perder a memória. Começo a morrer para a vida ser mais intensa. Se duvidarmos do amanhã, o hoje não poupará na plenitude. Escrevo minha história para não publicá-la, quero ser uma carta que ficou por ser enviada.

Cáh Morandi

junho 23, 2013

poesia de domingo


Poesia é cada manhã de domingo, é despertar do sonho na segurança do abraço, é alvorecer dentro da preguiça das horas, é tardar nos planos, é transferir a fome para matar a sede, é comprometer o juízo pelos lençóis, é demorar na respiração para se reconhecer no cheiro do corpo amanhecido, é recontar os arrepios da pele para se perder no calafrio, é adoçar o beijo ainda nos próprios lábios, é abrir os olhos para cerrar os cílios da alma, é não ter pressa de se reconhecer para ser anônimo na dor, é buscar o livro da cabeceira para redecorar o vocabulário, é adiar o movimento para estremecer na permanência, é procurar as costas debaixo das cobertas para deitar o toque. Poesia é sempre um domingo, é sempre esta manhã em que posso escolher as palavras. Tua voz penetra calmamente meus ouvidos e me convida para namorar o dia. Hoje só serei encontrada no amor.

Cáh Morandi

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