(Título: Janelas abertas, Tom Jobim e Vinícius de Moraes)
O
amor seria somente mais uma palavra. Uma palavra como outra qualquer: cadeira,
livros, horizonte ou paralelepípedo. Uma palavra perdida em um dicionário. Uma
palavra imprecisa em uma canção. Uma palavra escrita numa placa no deserto. O
amor poderia ser o deserto ou a canção, porque às vezes, nos dá uma espécie de
sede, em outras, um carinho ao pé do ouvido.
Quem
sabe o amor passasse despercebido, em silêncio, tão em calmaria que nem
distraísse minha atenção das outras coisas bobas do mundo. Quem sabe o amor
chegaria, como chegam correspondências de promoções, que a gente amassa e joga
fora. Quem sabe o amor viesse como uma rosa entre as outras rosas em buquê, e
olhando de cima, é tudo tão igual. Quem sabe fosse uma rua desconhecida, um
creme para as mãos, um jeito de sorrir ou olhar, uma mania, um prato árabe, uma
pizza, um peixe que vive só no Mar Egeu, uma marca de xampu ou de relógio, um
sabor de suco, uma fruta. Embora para tudo, seja todo o sentido.
Poderia
sim ser quase nada, se não tivesse sido tudo. Poderia não ter significância ou
significado, senão fosse você. Senão fosse seu riso me chamando para dançar no
meio do mundo, senão fosse seu nome se espalhar por todos os cantos dos meus
pensamentos e os poros da minha pele, senão fosse o seu olhar na primeira vez
que te vi, senão fosse seu ar de segurança, senão fosse sua simplicidade em
falar. Se por um momento só, você não tivesse sido tão profundo. Se por um
momento só, não tivesse sido você, teria sido tudo inútil, teria sido tão em
vão.
O
amor vem depois de você, e as palavras vem depois do amor. Tão clichê, tão
bobo, quando a gente quer dizer que está apaixonada e sente tão amada a ponto
de esquecer o resto do mundo. Tão tola nossa forma mais planejada para não ser
amarrada pela paixão. Não vale nada toda razão quando o coração desperta.
O
amor seria sim como qualquer palavra, se não fosse sua chegada.
Cáh Morandi