outubro 11, 2008

Dangerous


O que faz com que as pessoas vejam em mim a delicadeza? Será esse meu rosto claríssimo em contraste com o negro dos cabelos cacheados? A boca desenhada em “forma de coração” pintada como uma tela de um vermelho ardente? Os olhos pequenos, levemente puxados, abraçados pelos longos cílios? As mãos pequenas cuidadas porque quem tem um jardim de palavras? E como pode ser que seja isso que eu transpareça? E essa coisa tão selvagem no meu jeito de olhar ? E esse fogo, coisa que são só dos dragões, que me arde a garganta? E essas garras afiadas, cuidadas, como se não pudessem arranhar, cravar, fazer doer? E essa fera que me revira por dentro, que parece que sangra, que ronda, que me morde, que acorda quando quero dormir? Como pode ninguém perceber esse perigo que sou, esse bicho feminino que anda por aí a solta, revolta, em vez de pêlo, encoberta de pele e malha fina.



(Cáh Morandi)

outubro 07, 2008

Para dias sem esperança



Eu que já não tinha coração
Não tinha olhos de atenção
Nem mãos procurando par
Não tinha nada além da madrugada
Além da certeza exata:
Nunca mais amar.

Quem diria, quem apostaria
No que custo acreditar?
Eu que já não tinha vida
Não tinha casa e nem lar
Eu que caminhava perdida
Cheia de ferida antiga
Que esperança tinha
De sentir o que agora sinto
De não saber nem o que digo
Assim que você acordar...

(Cáh Morandi)

outubro 04, 2008

Sobre a nudez


Estávamos nus um frente ao outro. Não nos sentíamos tímidos ou envergonhados. Estivemos assim, despidos, desde a primeira vez. Aonde nenhuma palavra poderia ser duvidosa, nenhum gesto incerto. Nós possuímos uma verdade absoluta: não queríamos mais nada além de uma possibilidade. De uma chance que nos trouxesse a vida novamente. É bom estar nu na frente de quem se ama, nenhuma máscara finge a feição da face, nenhum pano esconde o que o outro já conhece a dedos e bocas. O corpo tenta esconder a alma, mas a alma também está nua, e dançando, na retina dos olhos.



(Cáh Morandi)

outubro 03, 2008

Sobre possuir

(foto: Cáh Morandi)


não nos basta o brilho dos olhos
os beijos doces e delicados
os abraços para dormir
o carinho, o sussurro,
a presença e o cheiro
nem mesmo
os laços invisíveis
que o amor nos envolve
não nos basta
essa raridade
de possuir
o essencial
o imprescindível



(Cáh Morandi)

setembro 29, 2008

take me


não me leve embora
me leve a sério
me leve agora
para dentro
para cama
para uma noite
inteira
para uma vida
passageira
mas me leve
para algum lugar
para algum país
me faz feliz
me faz, me leve



(Cáh Morandi)




setembro 25, 2008

Grão


Quando se é planta, quando se é verde,
pega-se um grão, pequena semente
e deixa numa parte que se supunha
ser da gente, só para ver se germina
depois se cruza as mãos
e põe toda a fé para chover
só para ver se a gente cresce
quem sabe floresce
dentro daquele coração
de repente somos flores,
de repente somos árvores,
de repente somos grama,
de repente ficamos grãos,
mas isso não é motivo de
tristeza ou de frustração
nem todo coração
suporta o nascer de
uma primavera



(Cáh Morandi)

setembro 21, 2008

Os espaços vazios




Nunca soube o que fazer
com os espaços que ficam
depois que alguém vai embora
uma dúvida insiste
e de tanto, o meu tentar desiste
de trocar a ausência
por qualquer coisa que fira menos:
nada para repor
nada para suprir
nada que realmente comportasse
o encanto de algo que ficou
para trás



(Cáh Morandi)


setembro 17, 2008

e quem diria
que o amor se fazia
à meia luz
de uma madrugada
que sorria?

ah, quem pensaria
que amor é só poesia
a meia noite
de uma lua clara
que amanhecia?


(Cáh Morandi)

setembro 12, 2008

12th September


Cai uma chuva gelada por trás da vidraça. Os dedos dos pés impacientes dentro da meia de lã, as mãos se aquecendo com a xícara de café, os lábios sendo mordiscados com os dentes, um pijama velho, um moletom jogado em cima, os cabelos bem amarrados, os olhos pequenos e perdidos acompanhando o desenho que água faz no vidro da janela.Não me importo em estar assim despojada, só quero me sentir o máximo bem que puder, embora seja improvável isso acontecer em uma noite de sexta, quando o fim de semana chega e você não tem ninguém. Ninguém que vá te abraçar enquanto a chuva cai lá fora. Ninguém que vá acalmar a tempestade que acontece dentro de você. Ninguém que vá te dar a mão quando você tem tanto receio de estar sozinha. Ninguém que ficaria ali, de graça, deitado ao teu lado escutando os trovões. Por um instante você pensa que isso é tão triste, que isso pode ser tão miserável e o amor parece ser uma esmola que você pede em troca de um sorriso, por mais falso que isso pareça. Frágil, o barulho da chuva viola o silêncio do pensamento, da lembrança, da doce ignorância em planejar o futuro. Você tem medo, porque você vê que tem tanta lágrima por dentro, escondida, calada, tímida e um dia chuvoso e frio é tão pouco comparado a tudo que você esconde atrás de um rosto discretamente limpo e doce.




Cáh Morandi

setembro 11, 2008

Atrevimento

Não acredito em meus medos
Nem crio mais pesadelos
Que me fazem perder

Não acredito em meus debates
Nem crio mais impasses
Que me fazem reter

Sou inteira em cada envolvimento
Saltando buracos ao relento
Com vínculo ao clarear

Sou certeira em cada movimento
Cortando as curvas do vento
Com ímpeto ao voar



(Cris de Souza e Cáh Morandi)

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